As leis da cidade | Espaço dedicado a textos sobre legislação
Tiago Azevedo Ramalho
[O texto introdutório pode consultar-se aqui.]
– 9. Terceira atitude: o cerrar de fileiras diante do assalto ao texto constitucional. – Finalmente, uma terceira atitude caracteriza os projectos de revisão constitucional do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda. Situam-se os referidos projectos numa posição de defesa do texto constitucional ante o que divisam ser um assalto à sua integridade. Interessante é, porém, como cada cerrar de fileiras segue uma lógica diferente.
No caso do Partido Comunista Português, a tónica é colocada em restaurar o sentido originário do texto constitucional, que haveria sido sucessivamente descaracterizado: «A Constituição de 1976 incorporou no seu texto os anseios e as conquistas do povo português com a Revolução de Abril. É por isso a Constituição de Abril. Ao longo da sua vigência e desde o seu início, as forças políticas e sociais que nunca se conformaram com o seu conteúdo, procuraram sistematicamente descaracterizar a Constituição, designadamente nas sucessivas revisões a que a sujeitaram. São os mesmos que conduziram e conduzem as políticas de direita que contrariam no fundamental, seja por acção, seja por omissão, os princípios e as disposições da Constituição da República Portuguesa.» Pretende-se, por conseguinte, salvaguardar a fidelidade ao como que mito fundador do texto constitucional, evitando os propósitos de «de subversão do regime democrático constitucional». Os adversários são expressamente nomeados: os «partidos da direita e da extrema-direita».
No caso do Bloco de Esquerda, o acento é colocado no desenvolvimento do texto constitucional. Aderindo ao espírito do texto constitucional e dos meios destinados à sua garantia (especialmente os meios de fiscalização da constitucionalidade), propõe-se a oferecer-lhe certo desenvolvimento de acordo com o ideário que nele vê e no qual se revê: o procedimento de revisão constitucional é, para esta força política, uma «oportunidade para consagrar novas e actualizadas exigências de protecção social e igualdade, de alargamento da participação democrática, de respeito pela natureza e pelas outras espécies, de salvaguarda do futuro do planeta de que somos parte.» Sempre na perspectiva (aliás correcta) de que «não existem constituições neutrais». Embora as propostas constantes do projecto de revisão constitucional venham a ser expostas com serenidade – como adiante haverá oportunidade de considerar –, são-no porém contra um pano de fundo de exposição de motivos de sabor apocalíptico: «O actual quadro é também marcado pela chamada policrise, que entrecruza os sinais alarmantes de catástrofe climática, desafios globais de saúde pública – em particular a pandemia de covid-19 e as suas repercussões presentes -, os factores de instabilidade geopolítica – em particular uma guerra em território europeu com sérios riscos atómicos -, num ambiente de instabilidade financeira permanente.»
Conhecidas as declarações de intenções das diferentes forças políticas que apresentaram projectos de revisão constitucional, é momento de olhar para o teor das propostas apresentadas.
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