Sex. Mar 29th, 2024

 

Pe. Georgino Rocha 

Isabel proclama feliz, Maria, sua prima, porque acreditou na mensagem que Gabriel, o enviado de Deus, lhe anunciara. A fé de Maria abre caminho a quem acolhe Deus na sua vida e com Ele colabora na realização do projecto de salvação. A felicidade de Maria – expressa tão bem no poema/cântico do Magnificat composto certamente por Lucas – brota da leitura da história, tempo e espaço onde Deus actua e quer envolver-nos. A nossa correspondência livre e generosa origina a experiência feliz de sermos amados e responsabilizados. Lc 1, 39-45.

A fé “incarna na vida concreta, afirma o Papa Francisco na recitação do ângelus perante centenas de pessoas reunidas na Praça de São Pedro. Toca a carne e transforma a vida de cada um”. E acrescenta: “Cada um de nós – não o esqueçamos – é uma missão a cumprir. Portanto, não tenhamos medo de perguntar ao Senhor: o que devo fazer?”

Isabel e Maria configuram o rosto social de quem, na cultura judaica, é insignificante e menosprezado. Mulher que não tivesse filhos era desconsiderada e objecto de comentários insultuosos. Uma estéril e em idade avançada, outra virgem e adolescente! Ambas de aldeias quase ignoradas no mapa das terras que contam para a gente ilustrada do tempo. Ambas de famílias modestas, apesar de sérias e piedosas. Ambas dotadas de uma confiança total que as disponibiliza para o “impossível”. Ambas doadas em atenção mútua e delicada. Que encanto!

“A ternura indica proximidade não apenas através da competência, mas acima de tudo através da participação na vida concreta das pessoas. É uma proximidade entendida como partilha, cuidado e amor. Espero que a grande provação que vivemos na pandemia nos tenha feito sonhar com uma nova proximidade entre todos. Uma nova ternura… Somente quando voltarmos a nos preocupar acima de tudo com os que estão em situação de marginalidade, daremos sinais de mudança real”, adianta o Papa Bergoglio.

E o “impossível” acontece. Os filhos-prenda nascem e confirmam a esperança que habita e floresce no coração das mães. Zacarias e José, cada um a seu modo, vêem superadas as provações por que passaram. De Zacarias, fica-nos um cântico de libertação; de José, apenas o silêncio contemplativo, o olhar penetrante, a obediência fiel.

Estas duas mulheres juntas mostram que, mesmo nas situações mais humildes, se pode cultivar a flor da esperança que não murcha com o tempo nem com a adversidade. Uma confirma a outra no valor da fé confiante. “Parece” que estão a fazer uma sessão de preparação sinodal em casa de Zacarias e a cimentar a certeza de que vale a pena esperar contra toda a esperança.

Juntas, sabem proclamar a humanidade dos nascituros e a presença activa do Deus da vida. Juntas, são rosto do serviço anónimo que resume o de tantas mãos do nosso tempo. São espelho de quem fala de Jesus com enlevo, ternura e desassombro e não dos problemas / queixumes que certamente as assaltavam e limitavam. Juntas, constituem um espelho da Igreja que anuncia, celebra e serve a Cristo e a sua oferta de misericórdia, de libertação, de justiça, de pão, de fidelidade, de esperança.

Feliz és tu! A tua colaboração faz com que se cumpra tudo o que te foi dito da parte do Senhor. Também hoje Deus está no meio do seu povo, percorre em silêncio os atalhos da vida, faz-se singelamente humano, age escondido em tantos gestos de boa vontade e solidariedade (Margarita Saldaña).

Alia a fé confiante à ousadia criativa como Isabel e Maria e ajuda a ser mais humano e feliz o Natal de tantos menosprezados sem teto nem pão, sem agasalho nem trabalho, sem consolação nem alegria de viver. Que a porta da cova de Belém se abra e haja Natal abrigado e feliz para todos. 


Visitação, fresco no Apartamento Bórgia do Palácio Apostólico do Vaticano