Um olhar atento ao tempo que flui
Victor Bandeira*
O Padre Manuel Marques Capeleiro e Silva nasceu às 2 horas da manhã, do dia 31 de Agosto de 1873, no lugar das Frias, em Albergaria-a-Velha. No ano de 2023, fez-se memória agradecida da data jubilar dos 150 anos do seu nascimento. O seu pai chamava-se João Mateus Capeleiro e a mãe Maria Marques da Silva, sendo ambos lavradores e naturais da paróquia de São Miguel de Fermelã. Sabe-se que teve uma irmã, além de um tio residente em Fermelã, que desempenhou o cargo de Vereador da Câmara Municipal de Estarreja, Manuel Baptista Beirão. Os avós paternos eram João Mateus Capeleiro e Maria Ribeira dos Santos, e os avós maternos, João José da Silva Laranjeiro e Maria Domingues Marques.
Este clérigo estudou no Liceu de Aveiro, passando mais tarde para o antigo Colégio dos Carvalhos e, de seguida, para o Seminário do Porto, onde concluiu o curso de Teologia.
A 6 de Agosto de 1899, foi ordenado sacerdote na diocese do Porto, perfazendo, neste ano de 2024, os 125 anos da sua ordenação sacerdotal. Apresentava apetência e um dom especial para a música, tendo sido o fundador da Banda Musical de Lagares (Penafiel), no ano de 1900, onde foi pároco, entre Março de 1900 e Junho de 1901. Esta formação musical, originalmente com 12 músicos (“3 clarinetes, 1 baixo, 2 trombones, 1 cornetim, 1 trompa, 1 flauta, 1 bombardino, 1 bombo e pratos”), teve como objectivo a preparação da festa de Nossa Senhora da Lapa, a 8 de Setembro de 1900.
Seguidamente, assumiu a paroquialidade de São João de Loureiro (Oliveira de Azeméis), onde foi pároco entre Julho de 1901 e Agosto de 1903. Aqui também se envolveu na preparação de músicos da recém-fundada Banda de Música de Loureiro.
Entre Março de 1904 e Junho de 1905, foi pároco de Santo André de Canidelo (Vila Nova de Gaia).
A 1 de Julho de 1905, pelas 11 horas da manhã, inicia o seu múnus como pároco de São Bartolomeu de Veiros (Estarreja), cuja posse lhe foi dada pelo Padre Júlio, que desempenhava funções de Secretário da Câmara Eclesiástica do Porto. Fizeram-se presentes, neste acto, o Dr. Egas Moniz (Prémio Nobel da Medicina e Deputado da Nação, natural de Avanca), o Presidente da Câmara Municipal de Estarreja, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, e vários párocos e outros sacerdotes. A 23 de Julho de 1905, já procedia à arrematação da obra de lajeamento a granito a fazer no adro defronte da porta principal da igreja. Poucos meses após a sua entrada na paróquia, lia-se, no jornal “O Concelho de Estarreja”, datado de 13 de Janeiro de 1906, que já tinha conseguido “conquistar as simpatias de todos nós pelo seu porte exemplaríssimo no desempenho do seu cargo”, mais ainda atesta “que, devido à sua benevolência, à sua rectidão e ao seu espírito conciliador, a freguesia de Veiros o estima e respeita desde o mais humilde ao mais alto e considerado dos seus filhos”.
Em Veiros, foi reitor, durante 33 anos e 3 meses, tendo sido o pároco que mais tempo esteve em exercício nesta paróquia, terminando o múnus a 9 de Outubro de 1938, quando se procedia à passagem da paróquia para a restaurada Diocese de Aveiro. Contudo, permaneceu em Veiros, onde viveu até à data da morte, a 28 de Fevereiro de 1951. Faleceu, subitamente, pelas 5 horas da madrugada, na sua casa sita no lugar do Pinheiro. Ofereceu a sua casa com o quintal para residência paroquial de Veiros, a qual foi vendida, mais tarde, e demolida no ano de 1992. Encontra-se sepultado no cemitério de Veiros, sendo a primeira sepultura do lado direito, junto ao portão principal. No final de cada funeral, era hábito do Padre “Nédio” (Padre António Tavares Afonso e Cunha), seu sucessor, antes de sair do cemitério, rezar junto à sua sepultura com a irmandade que o acompanhava.
À época em que preparava e compilava os conteúdos para o livro dedicado às memórias paroquiais de São Bartolomeu de Veiros, fascinava-me a caligrafia deste sacerdote, cuja letra era perfeitamente perceptível, cuidada e esmerada. Os seus apontamentos e a sua dedicação trouxeram à luz dos nossos dias alguns traços da história da paróquia, que teve o cuidado de transcrever e dactilografar para melhor se compreender, como é exemplo o documento da Fundação da Capela do Senhor da Ribeira, de meados do século XVIII, e que transcreveu em 1938. Por estes dias, celebramos várias das suas datas jubilares, como os 150 anos do seu nascimento, 125 anos de ordenação sacerdotal e os 75 anos da sua morte. A vida ligada à música (sabia tocar violino, violão e flauta), e que a muitos inspirou, na sua época, deixa um legado que tem continuidade ainda hoje, através da existência de pelo menos duas das bandas de música que ajudou a fundar ou com quem colaborou, a Banda Musical de Lagares e a Banda de Música de Loureiro, ambas centenárias. Em Veiros, a rua onde viveu e teve residência foi denominada de Rua Padre Capeleiro.
Referências
Bandeira V. (2018). Memórias da Igreja de São Bartolomeu de Veiros – Chão Sagrado. Tempo Novo Editora. Aveiro. 461 pp. [ISBN: 978-989-99806-9-3].
Livros de Assentos de Baptismos, Casamentos e Óbitos da Paróquia de Santo André de Canidelo (1904-1905).
Livros de Assentos de Baptismos, Casamentos e Óbitos da Paróquia de São João de Loureiro (1900-1903).
Livros de Assentos de Baptismos, Casamentos e Óbitos da Paróquia de São Martinho de Tours de Lagares (1875-1909).
Musorbis 2020 | By Blendup Marketing Digital. In: https://www.musorbis.com/penafiel-e-as-suas-filarmonicas/.
O Concelho de Estarreja (Jornal político e noticioso da região do concelho de Estarreja com sede em Pardilhó).
Pires Bastos M. (2019). Banda de Música de Loureiro – uma banda centenária. Banda de Música de Loureiro. Loureiro. 366 pp.