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Comissão Diocesana da Cultura | Aveiro Manifesto por uma cultura da autêntica paz

Comissão Diocesana da Cultura | Aveiro Manifesto por uma cultura da autêntica paz

Tomar nas mãos um mapa do mundo contemporâneo e nele identificar os lugares onde a guerra tem a palavra deve inquietar-nos. A guerra é real em mais de cinquenta lugares do mundo.

Com custos imediatos de vidas perdidas, de insegurança, intranquilidade… Assomam-nos ao espírito as lágrimas de inocentes, os seus choros e gritos perdidos, os olhares vazios…

Irmãos e irmãs como nós a quem matam a vida, a memória, o presente e o amanhã.

‘A guerra é a falência da humanidade’, recordava Francisco, em outubro de 2020.

As suas palavras continuam a ecoar como voz de incómodo.

Leão XIV chama-lhe a «barbárie da guerra’.

A guerra é a resistência a humanizarmo-nos. É o regresso sempre repetido à fase anterior àquela em que começámos a mostrar-nos humanos.

O Cardeal Tolentino de Mendonça recordava, no seu discurso de 10 de junho de 2020, a que deu o belo título de ‘o que é amar um país’, que o primeiro sinal de humanidade foi um fémur cicatrizado. Um fémur cicatrizado é o símbolo pungente de não deixarmos para trás ninguém, e muito menos o mais frágil.

Os sinais de regresso ao momento anterior ao da cicatrização do fémur devem perturbar-nos e levar-nos a pretender tudo fazer para construir uma cultura da autêntica paz. A paz que não é mera ausência de guerra, mas baseada, primeiramente, na justiça (dar a cada um o que lhe é devido) e, quando esta já é insuficiente, sustentada no reconhecimento de que o outro é um irmão, sustentáculo da genuína fraternidade.

Para esse reconhecimento, muito se espera das religiões (infelizmente, tantas vezes instrumentalizadas para a guerra), origem explícita do reconhecimento de que, por via da fé num Pai comum, todos nos tornamos irmãos.

A Comissão Diocesana da Cultura|Aveiro une-se, por isso, a todas as vozes que se deixam comover, no coração e através das suas mãos, para a construção de uma realidade verdadeiramente humanizada e não inumana.

Nessa comoção de coração, devem envolver-se todos os agentes, desde os legisladores, passando pelos decisores económicos, promotores dos mais diversos âmbitos da vida comum, promovendo uma autêntica cultura da vida e da paz, desde o início, passando pelas realidades mais frágeis, até ao seu fim não provocado.

Sem o respeito pela vida de todos, todos, todos, a cultura da humanidade será, sempre, injusta, porque alguns deixará de fora.

Esta comissão apela, por isso, à construção de uma cultura do acolhimento, do respeito, do reconhecimento de que ao outro sempre nos caberá amar e não repudiar ou rejeitar. O outro é condição de construção de cada eu. É perante o outro que nos reconhecemos sujeitos. O outro não é fonte do mal (poderá, pelo contrário, em muitas situações, ser, mesmo, sua vítima…). O outro pode ser o filho ainda não nascido, o imigrante fragilmente chegado, o refugiado de todos os pontos repudiado, o desempregado desolado, o preso abandonado, o sujeito estereotipado, etc., etc. O outro, humano como eu, merece reconhecimento; não a presunção da legitimidade de poder ser repudiado.

Os tempos desafiam, por isso, a uma visão da paz que perpasse em todas as condições da realidade: da família à escola, da economia à política, da diplomacia à interculturalidade, do ecumenismo ao diálogo inter-religioso, de… a….

Quem cultiva a violência por ela será devorado, talvez mais cedo do que tarde.

Quem promove a paz recolhe os frutos dessa sementeira.

A paz constrói-se sobre alicerces sólidos, numa espiral virtuosa, do princípio ao fim, superando lógicas de conflito permanente por lógicas fermentadas na disponibilidade para nos colocarmos nos ‘sapatos do outro’.

Ousemos. Ousemos sofrer a dor do outro. E nascerá daí um amanhã de vitórias comuns. Os nossos adversários não são os outros humanos, mas os desafios que decorrem da própria condição frágil que nos define como humanos. Perdemos tempo no combate contra os outros.

Por cada ‘outro’ perdido são mundos de esperança que se desvanecem.

Construamos uma autêntica cultura de humanidade: humanos frágeis que unem as suas fragilidades para delas fazerem forças…

No respeito pela verdade e autenticidade, pela justiça e busca do bem comum, sedimentado na solidariedade e no respeito pelas capacidades de cada um, rumo a uma sociedade de desenvolvimento integral, de todos, em todas as suas dimensões, e para todos.

Só há paz se, verdadeiramente, ousarmos confiar uns nos outros. Se a desconfiança for a base, não se espere que a paz possa emergir da ameaça de nos explodirmos uns aos outros.

Será um sonho desejar um mundo assim?

Aveiro, 22 de julho de 2025

A Comissão Diocesana da Cultura|Aveiro

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