Carta Pastoral e Programa 2017/2018
CARTA PASTORAL para o Programa Pastoral 2017-18
Dai-lhes vós mesmos de comer (Mc 6, 37)
Introdução
[1] O nosso Plano Pastoral incidiu, no último triénio, nas virtudes teologais. A fé, a esperança e a caridade caminham juntas. A fé mostra-nos o Deus que entregou o seu Filho por nós e assim gera em nós a certeza vitoriosa desta grande verdade: Deus é amor! Deste modo, ela transforma a nossa impaciência e as nossas dúvidas em esperança segura de que Deus tem o mundo nas suas mãos e que, não obstante todas as trevas, Ele vence. A esperança manifesta-se praticamente nas virtudes da paciência, que não esmorece no bem nem sequer diante de um aparente insucesso, e da humildade, que aceita o mistério de Deus e confia n’Ele mesmo no meio da escuridão. A fé, que toma consciência do amor de Deus revelado no coração trespassado de Jesus na cruz, suscita, por sua vez, o amor. Aquele amor divino é a luz que ilumina incessantemente um mundo às escuras e nos dá a coragem de viver e agir. O amor/caridade é possível, e nós somos capazes de o praticar, porque somos criados à imagem de Deus. Somos capazes de viver a caridade e, deste modo, fazer entrar a luz de Deus no mundo.
Promover uma Igreja Diocesana que vive a caridade na alegria da misericórdia, consciente de que o exercício da caridade é próprio do ser da Igreja e está alicerçado no seguimento de Jesus é o objetivo geral do programa pastoral 2017-2018, com o lema “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mc 6, 37).
As raízes bíblicas da caridade cristã
[2] As leis contidas no Antigo Testamento apontam para as principais razões através das quais se indica que o amor a Deus se traduz em amor ao próximo: são as razões da caridade.
No livro do Êxodo afirma-se: «Não usarás de violência contra o estrangeiro residente nem o oprimirás, porque foste estrangeiro residente na terra do Egito» (Ex 22,20). «Se penhorares o manto do teu próximo, devolver-lho-ás até ao pôr-do-sol, porque a capa é tudo o que ele tem para cobrir a pele. Com que é que ele se deitaria? E se vier a clamar a mim, ouvi-lo-ei, porque Eu sou misericordioso» (Ex 22,25-26).
[3] No Novo Testamento as leis ganham nova dimensão. Estas leis resumem-se a um único preceito: “Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Gl 5,14). O capítulo 25 do evangelho segundo São Mateus tem uma das páginas mais belas do amor ao próximo, quando Jesus se identifica com aqueles que passam qualquer necessidade: «Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes» (Mt 25,40). Esta novidade de Jesus constituiu uma profunda mudança no que diz respeito à visibilidade, eficácia e atualização da caridade.
O evangelho segundo S. João (Jo 13,1-20), conforme o documento do nosso Plano Diocesano de Pastoral (anexo 4), apresenta a cena do lava-pés como sendo a imagem mais perfeita da caridade cristã. Jesus cinge-se com uma toalha para realizar o grande e humilde gesto da lavagem dos pés aos seus discípulos. O ato de “lavar os pés” era comum no Antigo Oriente para honrar um hóspede que viera por caminhos poeirentos. Este gesto fazia parte da hospitalidade. Como sinal de carinho, podia ser feito pelos filhos ou pela esposa ou, como manifestação de dedicação, pelo próprio anfitrião, mas normalmente era feito por algum escravo. Porém, era um gesto tão humilhante que um judeu, reduzido à escravidão, devia recusar-se a fazer para não desonrar o seu povo. Mas Jesus lava os pés aos discípulos. A toalha ou o avental é o símbolo do serviço ao irmão. O serviço ao irmão é o distintivo que o cristão jamais pode depor, pois a todo o momento pode haver alguém que precise do seu serviço.
[4] O ensino de Jesus revela-se particularmente eficaz porque parte dum exemplo concreto de serviço humilde prestado por aquele que é o Senhor. Se o Filho de Deus se baixou tanto por amor aos seus discípulos, naturalmente estes devem servir uns aos outros.
Jesus deu um exemplo que os seus irmãos devem imitar: amar como Jesus os amou e prestar serviços humildes à imitação do seu Mestre e Senhor. É a coerência pastoral, fruto da aliança do dizer com o fazer. Continuar as ações de Cristo não é repetir ritos mas atitudes: amor e serviço. O amor sincero e o serviço alegre, ao estilo de Jesus, hão de ser o modo de presença de cada um neste mundo: despir, tornar-se escravo, pôr o avental, servir. Contra toda a lógica humana, Jesus garante àqueles que confiam na sua proposta: “Sereis felizes”. Esta é a surpresa: o dom de si mesmo é o único caminho que leva à alegria. Felizes os que perfumam os caminhos com a virtude da caridade!
Mais caridade nas mãos
[5] O exercício da caridade é constitutivo do ser e da missão da Igreja. A Igreja nasce da caridade e vive na caridade. Refletir sobre a caridade é entrar no coração da vida cristã. «Para a Igreja, a caridade não é uma espécie de atividade de assistência social que se poderia mesmo deixar a outros, mas pertence à sua natureza, é expressão irrenunciável da sua própria essência» (Deus caritas est 25). “Agora, permanecem estas três coisas: a fé, a esperança e a caridade. Mas a maior de todas é a caridade” (1Cor13,13).
A caridade representa o maior mandamento social; é o serviço que tem de prestar toda a pessoa humana, tal como refere São Camilo de Lellis, traduzido no lema “Mais caridade nas mãos”. Não há duvida que das mãos irradiam prodigiosos milagres. Assim como Deus é louvado pelos monges com o canto e com a voz, assim também é louvado por todos aqueles que com as mãos realizam obras de misericórdia para com o próximo. Todos os homens, incluindo os não cristãos, se encontram perante um ‘tu’ humano ao qual têm de dizer: acolho-te, compreendo-te, ajudo-te… Todos seremos julgados pelo amor. Contudo, o que os crentes estão chamados a manter vivo é a consciência de que o Senhor é a fonte de todo o amor: Ele torna visível, em forma humana, o amor de Deus.
Os pobres foram parte integrante do ministério de Jesus: viveu toda a sua vida pública a fazer-se próximo dos leprosos, dos possessos, dos que viviam mergulhados na miséria, dos sem-abrigo, dos que eram desprezados pela sociedade. Ele veio ao mundo para responder ao grito dos pobres e dos excluídos da sociedade, chegando mesmo a identificar-se com eles, “sendo rico, fez-se pobre” (2Cor 8,9). Jesus sofria com a rejeição de Jerusalém (cf. Mt 23,37) e, por esta situação, chorou (cf. Lc 19,41). Compadecia-Se também à vista da multidão atribulada (cf. Mc 6, 34). Vendo os outros a chorar, comovia-se e turbava-se (cf. Jo 11, 33), e Ele mesmo chorou pela morte de um amigo (cf. Jo 11,35). Estas manifestações da sua sensibilidade mostram até que ponto estava aberto aos outros o seu coração humano» (AL 144). A sua dor é uma dor de amor. Por sua vez, aquele que recebe a compaixão de Deus, deve manifestá-la para com o seu semelhante em atos concretos, pois só assim põe em prática a vontade de Deus.
[6] Para Jesus, a pobreza não é um ideal. A pobreza é um mal enquanto carência, enquanto significa desigualdade, mas também é uma virtude enquanto testemunho de vida. Os pobres e os marginalizados são privilegiados não porque sejam mais virtuosos ou piedosos, mas porque são “herdeiros do Reino” (Mt 5,3). Viver a virtude da pobreza significa um posicionar-se perante a vida, empenhar-se em confiar infinitamente em Deus, apoiando-se nele, viver decididamente para os outros, partilhando tudo o que se é e tudo o que se tem.
A opção preferencial pelos pobres está, pois, implícita no Cristo que se fez pobre por nós, para nos enriquecer com a sua pobreza. Chega até ao desprendimento total, pondo essa disponibilidade ao serviço dos valores do Reino. «Se queres ser perfeito, vai, vende todos os teus bens e dá aos pobres, e terás um tesouro nos céus. Depois, vem e segue-me» (Mt 19,21). O papa Francisco, reafirmando a opção preferencial pelos pobres, exorta-nos ao compromisso dum amor ativo e concreto a cada ser humano. Se verdadeiramente partimos da contemplação de Cristo, devemos saber vê-lo no rosto daqueles com quem Ele mesmo quis identificar-se: «Não percamos tempo a imaginar os pobres do futuro, é suficiente que recordemos os pobres de hoje, que poucos anos têm para viver nesta terra e não podem continuar a esperar. Por isso, para além de uma leal solidariedade entre as gerações, há que reafirmar a urgente necessidade moral de uma renovada solidariedade entre os indivíduos da mesma geração» (LS 162).
A caridade de Jesus, enraizada no amor do Pai, é, portanto, a norma, a fonte e a medida da caridade da Igreja. Vivê-la supõe uma reorientação da vida e da ação de cada um de nós, das nossas comunidades cristãs e movimentos apostólicos, numa palavra, de toda a nossa igreja diocesana.
Reino de Deus, justiça social e caridade cristã
[7] Os valores deste reino são os que suplantam as duas túnicas, os alforges e as provisões. Para construir este Reino, Cristo não tinha onde repousar a cabeça (cf. Lc 9,58). Os pobres, como referem as bem-aventuranças, não fazem deste mundo o seu reino. O Reino de Deus é-lhes específico; acolhe preferencialmente os pobres.
Jesus aponta-nos um caminho. Para ingressar no Reino é necessário ter uma vida de coerência com a Palavra de Deus e com as propostas de Jesus. É preciso fazer a vontade do Pai. Toda a vida de Jesus é um contínuo viver para que todos tenham vida e vida em abundância, para que sejamos livres e responsáveis, para que sejamos felizes e façamos os outros felizes. Sempre que se encontra com situações humanas de necessidade corta-se-lhe a alma e comove-se profundamente, a ponto de que a sua imensa bondade intervém como sinal da presença e vontade vivificadora de Deus. Quando essas situações de necessidade são fruto da injustiça dos homens, à compaixão acrescenta-se a indignação, e a sua voz põe em evidência a perversidade e clama verdade e justiça, para que muitos se deem conta da realidade e se levantem.
Refere o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica que «a caridade é a virtude teologal pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos por amor de Deus. Jesus faz dela o mandamento novo, a plenitude da lei. A caridade é “o vínculo da perfeição” (Col 3,14) e o fundamento das outras virtudes, que ela anima, inspira e ordena: sem ela “não sou nada” e “nada me aproveita” (1Cor 13,1-3) – (CCE 388).
[8] As razões da caridade e da justiça encontram-se, portanto, na vontade de Deus e no coração do homem, e, em última instância, sintetizam-se na pessoa de Jesus Cristo. Não existe outro atributo divino que a Sagrada Escritura mais enalteça do que a sua misericórdia. A misericórdia é, sem dúvida alguma, a nota mais característica do Deus de Israel, que se relaciona com o seu povo, como um pai o faz com os seus filhos: «Como um pai se compadece dos filhos, assim o Senhor se compadece dos que o temem. Na verdade, Ele sabe de que somos formados; não se esquece de que somos pó da terra» (Sl103,13-14).
Falar da caridade significa falar também da justiça; A caridade tem na justiça a sua expressão social. O amor pelo homem e, em particular, pelo pobre, no qual a Igreja vê Cristo, concretiza-se na promoção da justiça. A justiça consiste na constante e firme vontade de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido; mostra-se particularmente importante quando a pessoa, na sua dignidade e direitos, é ameaçada pelo recurso exclusivo aos critérios da utilidade e do ter; o que é ‘justo’ não é só determinado pela lei, mas pela identidade profunda do ser humano; a justiça, sozinha, não basta, e pode mesmo chegar a negar-se a si própria se não se abrir àquela força mais profunda, que é o amor. «Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu» (Mt 5,20). Só o amor faz sentir como próprias as carências e as exigências alheias e torna mais intensas a comunhão dos valores espirituais e a solicitude pelas necessidades materiais. Assim, justiça social e caridade cristã não se excluem, mas antes asseguram a existência qualificada da sociedade humana. A caridade exige a justiça como base, pressupõe e transcende a justiça. Só assim podemos construir o bem comum porque ele «pressupõe o respeito pela pessoa humana enquanto tal, com direitos fundamentais e inalienáveis orientados para o seu desenvolvimento integral» (LS 157) É uma obrigação que provém do mandamento de Deus, mas é também um desejo que habita no coração do homem. «O dever imediato de trabalhar por uma ordem justa na sociedade é próprio dos fiéis leigos» (Deus caritas est 29).
[9] A ‘santidade’ que o Senhor exige não se manifesta em formas de religiosidade externa, mas no amor, gratuito e desinteressado, ao irmão: “Quem não ama o próprio irmão que vê, não pode amar Deus que não vê” (1Jo 4,20). Os discípulos de Jesus não são os depositários de uma doutrina, ou de uma ideologia, ou os observadores de leis, ou os fiéis cumpridores de ritos, mas aqueles que, pelo amor mútuo, são um sinal vivo do Deus que ama. O amor de que Jesus nos fala é o amor que é paciente, que acolhe, que se torna serviço, que respeita a dignidade e a liberdade do outro, que não discrimina nem marginaliza, mas que se faz dom total, até à morte, para que o outro viva e seja feliz. Sendo Deus “assumiu a condição de servo” (Flp 2,5-8).
O serviço como prática do amor põe em movimento o que existe de melhor na pessoa, tanto a que ama como a que é amada: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos” (Jo 15,13). Este é o serviço supremo. A verdadeira dignidade do homem reside na entrega aos outros. Só o amor redime a pessoa e transforma a sociedade.
A caridade pastoral une o amor a Deus e o amor ao próximo
[10] Numa sociedade individualista e insatisfeita, mas cheia de anseios e de procuras, cada vez mais é oportuno e necessário implementar a cultura da proximidade: estar com e estar para. À pergunta caprichosa do doutor da Lei ‘Quem é o próximo?‘ Jesus responde contando a parábola do samaritano (cf. Lc 10,29-37). Relatou a história de um homem ferido, espancado e deixado meio morto, e de algumas pessoas que passaram ao seu lado: algumas que foram passando para o outro lado do caminho e uma que se aproximou.
A dor do homem ferido atinge profundamente o samaritano. Fazendo-se próximo do ferido, o samaritano faz-se próximo também da sua própria dor, faz-se próximo de si mesmo.
O próximo é aquele que aceita ver e escutar. Faço-me próximo quando aceito ver o outro na sua necessidade. Nesta parábola propõem-se três passos para realizar o amor misericordioso: ver, ter compaixão e agir. Ver o outro é condição essencial para fazer-se seu próximo: Viu-o e teve compaixão. A proximidade não é um estado, mas uma ação. O samaritano aceita ver e ouvir a dor do outro, até fazer ressoar em si a voz do sofrimento do outro – este é o modo de ouvir de Deus. Dizem os evangelistas que quando Jesus encontra um leproso (Mc 1,41) ou a viúva de Naim (Lc 7,13), ou quando vê as multidões que andam à sua procura (Mc 6,34), sente compaixão.
[11] A atitude para com o próximo não pode ter outros contornos que não sejam os do amor, que se mostra sempre insatisfeito. A nossa tentação é amar aqueles que o merecem, fazer o bem a quem nos corresponde… Contudo, amar a todos é a condição necessária para sermos discípulos de Jesus. Se o nosso olhar para o mundo for não apenas compassivo e crítico, mas de nos questionarmos e nos compadecermos com as reais situações, estaremos dispostos a denunciar as causas da injustiça. O próprio Jesus confronta-se com esta realidade: «Ai de vós, também, doutores da lei, porque carregais os homens com fardos insuportáveis e nem sequer com um dedo tocais nesses fardos!» (Lc 11,46).
O preceito “Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Gl 5,14) é uma síntese da vida de Jesus e um estatuto da comunidade cristã para concretizar o projeto de Deus: um amor sem limites (Jo 13,1), até lavar os pés e dar a vida pelos outros. O amor recíproco é sinal da presença de Jesus na comunidade cristã. Este amor concretiza-se através da defesa dos necessitados e desprotegidos: estrangeiros, viúvas, órfãos, endividados, pobres (cf. Ex 22,20-26). O amor cristão tem duas faces inseparáveis: faz brotar e crescer a comunhão fraterna entre os que acolheram a Palavra do Evangelho e leva ao serviço dos pobres, ao cuidado para com os sofredores, ao socorro, sem discriminação, de todos os que precisam (cf. At 3,1-9; 6,1-6; 9,36-42; 20,33-35). Se verdadeiramente partimos da contemplação de Cristo, devemos saber vê-lo no rosto daqueles com quem Ele mesmo quis identificar-se: «Tive fome e destes-me de comer…» (Mt 25,35-46).
[12] As ofensas à humanidade do homem são ofensas dirigidas a Deus. E o sofrimento do outro é também o meu. Nenhuma comunidade terá uma palavra a dizer ao mundo se não é sensível às necessidades e dramas da humanidade: a fome, a miséria, as vítimas da violência, a degradação ambiental, as necessidades dos migrantes e refugiados, entre outros. A cultura do bem-estar, por vezes, anestesia-nos, a ponto de perdermos a serenidade em prol dos outros. «O modo de nos relacionarmos com os outros, que em vez de nos adoecer nos cura, é uma fraternidade mística, contemplativa, que sabe ver a grandeza sagrada do próximo, que sabe descobrir Deus em cada ser humano, que sabe tolerar as moléstias da convivência agarrando-se ao amor de Deus, que sabe abrir o coração ao amor divino para procurar a felicidade dos outros como a procura o seu Pai bom» (EG 92).
A caridade é a forma, o princípio unificador de toda a ação pastoral. Urge redescobrir que só a presença real do outro nos torna humanos e que só o contacto com os outros nos coloca também em contacto com nós mesmos e com Deus. Perante os vários tipos de pobreza e de fragilidade, e nos quais somos chamados a reconhecer Cristo sofredor, o cristão não pode ficar indiferente. «Fechar os olhos ao próximo torna-nos cegos diante de Deus!» (Deus caritas est 16).
Onde está o teu irmão?
[13] Os pobres desafiam o trabalho da Igreja, da pastoral e das nossas atitudes cristãs. O serviço no amor é o cerne da proposta de Jesus e a primeira exigência da comunidade cristã. «Tal como Cristo consumou a redenção na pobreza e na perseguição, também a Igreja, para poder comunicar aos homens os frutos da salvação, é chamada a seguir o mesmo caminho. Cristo Jesus, “apesar da sua condição divina…, despojou-se da sua categoria e tomou a condição de escravo” (Fil 2,6) e “por nós sendo rico, fez-se pobre” (2Cor 8,9); assim a Igreja, que precisa de recursos humanos para cumprir a sua missão, não foi constituída para buscar a glória deste mundo, mas para pregar, com o seu exemplo, a humildade e a abnegação. Cristo foi enviado pelo Pai para anunciar a boa nova aos pobres e levantar os oprimidos (Lc 4,18), “para buscar e salvar o que estava perdido” (Lc 19,10); de modo semelhante, a Igreja ama todos os angustiados pelo sofrimento humano, reconhece nos pobres e nos que sofrem a imagem do seu fundador, pobre e sofredor, esforça-se por lhes aliviar a indigência e neles deseja servir a Cristo» (LG 8).
A Igreja, que está no mundo para dar continuidade à missão de Jesus, está no mundo através dos cristãos, das suas estruturas, e “partilha com todos alegrias e esperanças, tristezas e angústias” (GS 1). Nesta comunhão encontra-se o futuro da humanidade. A Igreja tem, pois, a responsabilidade histórica da narração da caridade: é no aqui e agora que ganha concretização, assume corpo de resposta aos desafios próprios do tempo e do lugar. A caridade cristã, que manifesta e mostra que “Deus é Amor” (1Jo 4,16) é, em primeiro lugar, a resposta àquilo que, numa determinada situação, constitui a necessidade imediata: as obras de misericórdia. Se Deus é amor, o amor deve estar sempre presente na vida dos filhos de Deus.
[14] Uma Igreja que não esteja preocupada com ser o centro, mas uma Igreja pobre para os pobres é o grande apelo que o papa Francisco faz a toda a Igreja «Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos. Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida» (EG 49). Todos são chamados a esta tarefa que está incrustada na própria essência de ser Igreja. «Dai-lhes vós mesmos de comer» (Mc 6,37) – repete-nos Jesus sem cessar. A caridade, na comunidade eclesial, não está pendente da existência de empobrecidos e de marginalizados no seu seio. Ela faz parte constitutiva da essência cristã e isto implica que deva estar presente em todas as nossas estruturas e prioridades pastorais (cf. Programa Pastoral 2017-2018, Introdução).
É dever fundamental do povo de Deus assumir a missão de ir ao encontro dos outros para lhes restituir a vida, a alegria. «A Igreja ‘em saída’ é uma Igreja com as portas abertas. Sair em direção aos outros para chegar às periferias humanas…» (EG 46). É notória a contribuição da Igreja no mundo atual, mas ainda é visível a falta de cuidado pastoral pelos mais pobres, a inexistência dum acolhimento cordial nas nossas instituições, e a dificuldade que sentimos em desenvolver uma experiência pessoal e comunitária da fé num cenário religioso pluralista e de indiferença religiosa. O homem de hoje, ávido de possuir e centrado na sua autossuficiência, pôs o seu coração no efémero, no transitório e relativo, mostrando-se individualista e radicalmente insatisfeito, agarrado a seguranças económicas ou a espaços de poder e de glória humana que busca por qualquer meio – valores que não enchem o coração e nem são a resposta que Deus espera de nós.
[15] Tanto os pastores como os religiosos e todos os fiéis leigos são chamados à caridade, a fazer a vontade de Deus e a seguir Cristo, fazendo com que a todos chegue a consolação, a palavra amiga e o estímulo do amor salvífico de Deus. «Toda a atividade, toda a situação, todo o compromisso – como, por exemplo, a competência e a solidariedade no trabalho, o amor e a dedicação na família e na educação dos filhos, o serviço social e político, a proposta da verdade na esfera da cultura – são ocasiões providenciais de um contínuo exercício da fé, da esperança e da caridade» (CfL 59). A virtude que orienta e anima a vida espiritual do presbítero, enquanto configurado a Cristo Cabeça e Pastor, é a caridade pastoral. O fazei isto em memória de mim significa “levar até ao extremo o amor pelos irmãos” (Jo 13,1), isto é, lavar-lhes os pés e “ficar feliz por fazê-lo” (Jo 13,17). «Pela misericórdia de Deus suplico-vos… que não vos conformeis com este mundo, mas deixai-vos transformar pela nova mentalidade, para serdes capazes de discernir o que é vontade de Deus, o bom, agradável e perfeito» (Rm 12,1-2).
[16] A caridade não é um mero sentimento; haurindo da Sagrada Escritura, em cada lugar e momento da história, é preciso abrir caminhos e dar respostas dinâmicas às realidades temporais: saúde, educação, cultura, atenção às novas formas de pobreza…. Ser misericordiosos com os pobres é o convite a um êxodo que consiste em sair de nós mesmos para ir ao encontro do outro; em deixar para segundo plano a procura da segurança e do conforto para nos abrirmos ao acolhimento. «Vai e faz tu também o mesmo» (Lc 10,37) — diz Jesus Cristo ao doutor da Lei. Assim, os discípulos ficam a conhecer a vontade de Deus, seguindo as pegadas de Jesus Cristo e aprendendo com Ele, que é «manso e humilde de coração» (Mt 11,29).
Ninguém pode sentir-se demitido da preocupação pelos pobres e pela justiça social. Responsabilidade pessoal e respostas institucionais organizadas são duas exigências decorrentes da caridade que devem caminhar a par. Todos temos o dever, iluminados pela fé, de contribuir para que a comunidade eclesial e a sociedade em geral se compadeçam com a situação de todos os que sofrem, conheçam as causas e as consequências que daí decorrem, para buscar caminhos de realização e a igualdade de todos os cidadãos, seja qual for a condição, a fé ou a ética a que pertençam; pelo que há necessidade de revigorar a solidariedade, perspetivar alternativas, criar horizontes, imaginar possibilidades e criar estruturas que consolidem a ordem social, política e económica.
[17] “Não amemos com palavras e com a língua, mas com obras e em verdade” (1Jo 3,18). Há efetivamente muitas pessoas e necessidades a precisar de uma resposta, sem esquecer que à pobreza material se acrescentam também numerosas formas de pobreza moral, cultural, espiritual e religiosa. É nosso dever cristão apoiar e confortar os que necessitam; estar ao lado deles, tornando esses momentos mais amenos, revigorando-os na fé. O papa Francisco sugere a criação de uma nova mentalidade, de uma nova cultura, que supere o individualismo… (EG 188) e diz: «Somos chamados a descobrir Cristo neles: não só a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas, mas também a ser seus amigos, a escutá-los, a compreendê-los e a acolher a sua sabedoria» (EG 198). Jesus, que lavou os pés aos seus discípulos, convida-nos a segui-lo e a viver em atitude de serviço.
Eucaristia e Caridade
A Eucaristia, mistério oferecido a todos e por todos
[18] No Catecismo da Igreja Católica, lê-se: «Tendo amado os seus, o Senhor amou-os até ao fim. Sabendo que era chegada a hora de partir deste mundo para regressar ao Pai, no decorrer duma refeição, lavou-lhes os pés e deu-lhes o mandamento do amor (cf. Jo 13,1-17). Para lhes deixar uma garantia deste amor, para ficar sempre junto dos seus e os tornar participantes da sua Páscoa, instituiu a Eucaristia como memorial da sua morte e da sua ressurreição, e ordenou aos Apóstolos que a celebrassem até ao seu regresso, «constituindo-os, então, sacerdotes do Novo Testamento» (CCE 1337).
Se é verdade que é a Eucaristia que faz a Igreja, também tem importância o princípio “a Igreja faz a Eucaristia”. A Eucaristia é Cristo que Se dá a nós, edificando-nos continuamente como seu corpo. Esta aparece na raiz da Igreja como mistério de comunhão. «Na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, a nossa Páscoa e o pão vivo que dá aos homens a vida mediante a sua carne vivificada e vivificadora pelo Espírito Santo: assim são eles convidados e levados a oferecer, juntamente com Ele, a si mesmos, os seus trabalhos e todas as coisas criadas» (Sacramentum Caritatis 16).
[19] A Igreja vive continuamente da Eucaristia. Uma vez que Jesus se retirou, começam a atuar os discípulos – a nova comunidade. Por meio deles, Jesus distribui o pão à multidão. «A Igreja recebe a Eucaristia de Cristo, seu Senhor, não só como um dom entre muitos, ainda que valioso, mas como o dom por excelência, porque é o dom de si mesmo, da sua pessoa na sua santa humanidade, assim como da sua obra de salvação» (João Paulo II, A Igreja vive da Eucaristia, 11). A Eucaristia é o testemunho da caridade infinita.
A caridade pastoral nasce da Eucaristia e nela encontra a sua mais alta realização. Na Eucaristia vive-se a experiência de comunhão com Deus e com os irmãos, numa atitude de fraternidade, de reconciliação, de acolhimento e hospitalidade, de partilha. Na Exortação Apostólica O Sacramento da caridade, Bento XVI evidencia esta ligação: «Cada celebração eucarística atualiza sacramentalmente a doação que Jesus fez da sua própria vida na cruz por nós e pelo mundo inteiro. Ao mesmo tempo, na Eucaristia, Jesus faz de nós testemunhas da compaixão de Deus por cada irmão e irmã; nasce assim, à volta do mistério eucarístico, o serviço da caridade para com o próximo, que consiste precisamente no facto de eu amar, em Deus e com Deus, a pessoa que não me agrada ou que nem conheço sequer. Isto só é possível realizar-se a partir do encontro íntimo com Deus, um encontro que se tornou comunhão de vontade, chegando mesmo a tocar o sentimento» (Sacramentum Caritatis 88).
O Pão Eucarístico, fonte de partilha
[20] A Eucaristia, que não se esgota na Missa, é muito mais que o deixarmo-nos deslumbrar pela presença real de Cristo nas espécies eucarísticas do pão e do vinho. Deve ajudar-nos a descobrir o verdadeiro significado do gesto eucarístico da entrega. Quem comunga e se torna um com Cristo une-se intimamente com cada irmão e deve expressá-lo no amor e no serviço aos outros. A centralidade da Eucaristia na vida da Igreja é atestada na fração do pão. «As nossas comunidades, quando celebram a Eucaristia, devem consciencializar-se cada vez mais de que o sacrifício de Jesus é por todos; e, assim, a Eucaristia impele todo o que acredita n’Ele a fazer-se “pão repartido” para os outros e, consequentemente, a empenhar-se por um mundo mais justo e fraterno. Como sucedeu na multiplicação dos pães e dos peixes, temos de reconhecer que Cristo continua, ainda hoje, a exortar os seus discípulos a empenharem-se pessoalmente: “Dai-lhes vós de comer” (Mt 14,16)» (Sacramentum Caritatis 88).
São muitos os que alimentados pela Eucaristia e oração têm dado testemunho de verdadeira ajuda aos irmãos, mas ainda é necessário converter muitos corações humanos. Por medo ou por vergonha acomodamo-nos, fazendo apenas o que nos diz a nossa consciência, descuidando aquilo que o próprio Jesus disse: “Se permanecerdes féis à Minha palavra, diz o Senhor, sereis verdadeiramente meus discípulos, conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (Jo 8,31-32).
A participação na assembleia litúrgica dominical, ao lado de todos os irmãos e de todas as irmãs com os quais se forma um só corpo em Cristo Jesus exige uma participação consciente do mistério que se celebra e comunica na palavra, nos gestos e sinais, e ao mesmo tempo a compreensão do que se diz e faz.
A Oração eucarística e o silêncio que acolhe e vivifica
[21] A oração eucarística, ação de graças ao Pai pelas maravilhas que realizou, e continua a realizar, na história da criação e salvação, dirige-se unicamente a Deus e só a Ele. É o ponto central e culminante de toda a celebração. Movida pelo elevado sentido do mistério e cultivando o enlevo pela presença de Jesus na Eucaristia, compreende-se que, ao longo dos tempos, a fé da Igreja se exprima através da exigência duma atitude interior de devoção e mediante uma série de expressões exteriores, tendentes a evocar e sublinhar a grandeza do acontecimento celebrado. A nossa resposta a esta presença envolta em sinais sacramentais deve ser de silêncio, adoração, aclamação…
Para escutar e acolher Deus, que se torna presente na vida de cada pessoa, é necessária uma preparação interior e exterior; preparação essa que começa logo pela maneira de entrar e estar nos espaços sagrados. Ciente do princípio novo de vida que a Eucaristia deposita no cristão e que a missão primeira e fundamental, que deriva dos santos mistérios celebrados, é dar testemunho com a nossa vida e com os nossos gestos, neste sentido, e porque é visível a falta de ambiente de concentração nas celebrações, e uma certa turbulência na entrada nos lugares de culto, apraz-me aludir à importância do silêncio também como elemento constitutivo da caridade. O silêncio é precioso para escutar e discernir e predispõe para a verdadeira participação. No silêncio fala a eloquência do amor, e ao Senhor só podemos escutar e louvar com as palavras do silêncio, e deixar que os outros o escutem e louvem também num ambiente de recolhimento e de silêncio.
Peço a todos – sacerdotes, diáconos, consagrados e leigos – que façamos um esforço por recuperarmos, em toda a Diocese, o silêncio orante antes e depois das celebrações, sobretudo na eucaristia dominical, e fazermos das nossas Igrejas espaços de encontro com Deus e de adoração a Jesus eucaristia.
Desafios Pastorais
[22] A Igreja está chamada a ser a epifania da caridade de Deus hoje. Todo o cristão, qualquer que seja a sua vocação e o lugar que ocupe na Igreja, está chamado a dar testemunho ativo da esperança através da sua vida e do exercício da caridade: a ser, unido a Jesus, pão repartido para a vida do mundo. Temos de dar vida àquilo com que nos comprometemos.
A conversão situa-se no âmago da ação. O sacrifício de Cristo é mistério de libertação que nos interpela e desafia continuamente. O amor, que procede do próprio Ser de Deus e que se transmite aos seus filhos pelo Filho através da ação do Espírito Santo, converte-se em luz para a sua própria vida e para aqueles que os contemplam: agora sois luz no Senhor. Temos de ser esta luz. Neste sentido, como desafios pastorais, sublinho alguns aspetos que devem merecer a nossa atenção:
1º A Eucaristia, como sacramento que nos alimenta ao longo do caminho da vida, precisa de ser colocada não como apêndice mas no centro de todo o dinamismo das nossas comunidades. O domingo, que perdeu muito do seu significado, tem de ser revitalizado. «O domingo, dies Ecclesiæ, não se distingue com base na simples suspensão das atividades habituais, mas por ser o dia em que a comunidade cristã se reúne para a celebração do encontro com o Senhor e os irmãos; dies hominis, porque dia de alegria, repouso e caridade fraterna. Viver segundo o domingo significa viver consciente da libertação trazida por Cristo e realizar a própria existência como oferta de si mesmo a Deus, para que a sua vitória se manifeste plenamente a todos os homens através duma conduta intimamente renovada» (cf. Sacramentum Caritatis 72 e 73).
2º Não nos agarremos a uma “pastoral de manutenção”. Apoiados no caminho de formação cristã, urge promover uma educação da fé eucarística que predisponha os fiéis a viverem pessoalmente o que se celebra. Façamos da Eucaristia fonte de caridade; que ninguém se sinta privado do acesso tanto à mesa da Palavra como à mesa da Eucaristia. Envidemos um esforço conjunto por incrementar o culto eucarístico; estimulemos a prática da adoração eucarística tanto pessoal como comunitária; cultivemos a beleza e a prática do silêncio nos lugares de culto.
3º A Eucaristia, fonte inspiradora de um autêntico agir cristão, prolonga-se na vida e reenvia-nos para o mundo; caridade divina e caridade fraterna constituem, pois, as duas faces do mesmo mistério. Se não sabemos olhar o mundo, a vida e as pessoas, com a compaixão com que Jesus as olhava, seremos comunidades cegas. Embora na nossa diocese não tenham faltado iniciativas no âmbito da ação social, impõe-se que se tenham em conta os problemas sociais e as pessoas que os vivem, atuando com ousadia e criatividade, de forma organizada, em colaboração com outras instituições da sociedade civil e parceria com instituições públicas e privadas, unindo e congregando esforços entre todos os agentes e instituições da Igreja – o que exige uma “Igreja em saída” e uma “igreja de portas abertas”. Embora sejam importantes as coletas e os gestos de ajuda por ocasião de grandes calamidades, o mais importante é desenvolvermos gestos que nos ponham em contacto direto com os problemas e nos façam participar ativamente nas soluções. Não se atenda apenas às antigas formas de pobreza, mas também às novas que surgem em consequência das numerosas mudanças económicas e sociais e que atingem novos segmentos da população. O testemunho cristão tem de se estender à defesa dos direitos humanos: ao respeito pela vida de cada ser humano, desde a conceção até à morte. A caridade tomará então, necessariamente, a forma de serviço à cultura, à política, à economia, à família, para que em toda a parte sejam respeitados os princípios fundamentais de que depende o destino do ser humano e o futuro da civilização. Procure-se garantir a assistência espiritual aos doentes e idosos e dar uma atenção específica aos migrantes.
O II Sínodo Diocesano de Aveiro diz-nos que devemos dispensar o maior cuidado à pastoral da caridade em cada paróquia, e que se promova a formação de grupos ou equipas que concretizem esta ação eclesial da comunidade; que se fomente a partilha cristã de bens; e que a Igreja Diocesana se empenhe em estimular todos os membros do povo de Deus a assumir o compromisso social e a despertar para o voluntariado social (cf. II Sínodo Diocesano de Aveiro, pg. 106-107).
4º Olhando para o pastor na comunidade, que segundo a bela expressão de Santo Inácio de Antioquia é aquele que “exerce a presidência da caridade”, o papa Francisco alerta para a necessidade de uma verdadeira comunhão com os leigos, valorizando a participação de cada um como uma marca distintiva da vida do sacerdote e força vital do seu ministério. É necessário promover os movimentos apostólicos para que penetrem nos ambientes e cuidar bem dos agentes pastorais, procurando que eles vivam sempre o seu ministério específico na identificação com Cristo. À comunhão e complementaridade de todos, traduzida e sentida no acolhimento dos sacerdotes, diáconos, consagrados e leigos da Diocese, se ficará a dever o dinamismo e a eficácia da nossa ação pastoral, procurando levar a todos os membros da Igreja diocesana e a tantos outros que vivem afastados da Igreja, o testemunho contagiante deixado por Cristo aos homens de todos os tempos e lugares.
O Plano Diocesano de Pastoral Socio-Caritativa – Ser a Igreja da Caridade – publicado em 2009, deve continuar a ser fonte de inspiração para a prática da caridade na nossa diocese de Aveiro. Urge implementar as estruturas e a organização (Parte IV) pedidas por esse documento, a fim de sermos uma comunidade verdadeiramente evangelizada e evangelizadora.
5º O Congresso Eucarístico Diocesano vai realizar-se entre 31 de maio e 3 de junho, do próximo ano. Importa que, a partir da Palavra e da ação, nos preparemos e consciencializemos da sua importância. Convido os sacerdotes, os diáconos e todos aqueles que exercem um ministério eucarístico a prestarem a máxima atenção à promoção de uma espiritualidade cristã autenticamente eucarística. Urge que o povo cristão aprofunde a relação entre o mistério eucarístico, a ação litúrgica e o novo culto espiritual que deriva da Eucaristia enquanto sacramento da caridade. Daí a necessidade de empreender iniciativas que levem a despertar e aumentar a fé eucarística, para melhorar o cuidado das celebrações e promover a adoração eucarística, para encorajar uma real caridade que, partindo da Eucaristia, atinja os necessitados.
Estimados amigos, o serviço no amor é a primeira exigência de toda e qualquer comunidade. Se Deus nos amou assim, também nós devemos amar-nos uns aos outros. Congratulo-me com o trabalho e dedicação de tantos que abnegadamente têm dado razões da fé e caridade cristã. Deixemo-nos interpelar pela palavra de Deus, pelo depósito da fé da Igreja e pelo tesouro da nossa herança espiritual, mas também pela realidade na qual queremos viver misericordiosos uns com os outros, tornando-nos responsáveis pela caridade e pela justiça.
Jesus Cristo continua a olhar-nos com amor e conta com o nosso testemunho e compromisso transformador. A todos peço a dádiva de uma mão de mais amor. Que a exemplo da vocação e prontidão de Maria, e de Santa Joana Princesa, modelo de caridade cristã, levemos Jesus Cristo, fonte da caridade e rosto do amor, a todos os “feridos da vida”.
Senhor Jesus, fonte de todo o bem,
abri os olhos do nosso coração
às necessidades e aos sofrimentos dos irmãos.
Inspirai as nossas palavras e obras
para confortarmos os que andam cansados e oprimidos.
Fazei que a nossa Igreja de Aveiro,
animada pelo Congresso Eucarístico Diocesano
e transformada pela caridade,
saiba viver e anunciar o amor de Cristo,
presente na Eucaristia,
e testemunhe a esperança de um mundo novo.
Nós Vos pedimos, Senhor Jesus,
concedei-nos muitas e santas vocações
laicais, sacerdotais e de consagração,
a fim de que as nossas obras deixem um rasto de luz
e todos juntos saibamos testemunhar
a alegria do Evangelho.
Amen.
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Aveiro, 14 de setembro de 2017
† António Manuel Moiteiro Ramos, Bispo de Aveiro
Dai-lhes vos mesmos de comer _Carta Pastoral e Plano 2017_18