Ter. Abr 16th, 2024
Modos de interação entre ciência e religião

Primeiro passo: mergulhar fundo

Miguel Oliveira Panão

 “(…) a fé não é uma ideologia, mas um caminho e, decerto, um caminho que nunca acaba. Começar a crer não significa poder apoiar-se em pilares de certezas, mas entrar na nuvem do mistério e aceitar o desafio: mergulha fundo!” (Tomáš Halík e Anselm Grün, “O Abandono de Deus”, Paulinas, 2016)

No âmbito do diálogo entre fé e ciência, a parte da fé é sempre a que interpela mais. Creio haver em muitos uma noção de fé algo imatura como “acreditar no que não se vê.” Imaturo porque qualquer cientista o faz, mas a diferença é que encontra meios (teoria e experiências) que permite aferir com lógica a existência do que não vê. O que não vê manifesta-se de alguma maneira e a capacidade humana de controlar esse manifestar está na base da confiança que uma pessoa tem naquilo que a ciência mostra, mesmo se não vemos. São exemplos disso as partículas fundamentais da física, ou a gravidade que não se vê, mas sente-se.

Porém, fico sempre intrigado quando perguntaram a uma criança por que razão acredita em Jesus-Eucaristia, ao que, sabiamente, responde: ”não se vê, mas sente-se.” No fim de contas, a resposta não é muito diferente, mas aparentemente – para muitas pessoas – é. Porquê?

Talvez esteja no modo como compreendemos a fé. É um caminho inacabado. É entrar na nuvem do mistério e aceitar o convite a mergulhar fundo. Ou seja, não é algo que controlamos, mas também que não nos controla. Pelo contrário, deixa-nos livres.

Começar a crer é deixar-se intrigar pelo sentido e significado da realidade da história que se desenrola à nossa volta. A fé não cresce, ou progride, mas aprofunda-se. E quando não vemos o fundo, receamos e não mergulhamos. Não há razões para não crer senão o medo de ser confrontado com a verdade de que não possuímos a Realidade-que-tudo-determina. É um caminho que se faz passo a passo. Esta reflexão pode ser o primeiro.

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