Modos de interação entre ciência e religião
Sexto Ponto: Noofulness
Miguel Oliveira Panão
Vivemos num mar de informação ou num deserto? Quando pensamos num mar temos a ideia de abundância, enquanto um deserto reflecte a escassez, pois, não há água. Talvez a ideia provenha da experiência de como a água é importante para a nossa sobrevivência. Mas quando aplicamos esta analogia à questão da informação, essa será água abundante de um mar ou grãos abundantes de um deserto? Depende.
A quantidade de informação produzida e consumida por dia é incomensurável. A vida digital veio sobrepor-se, em muitos aspectos, à vida física. O tempo que deixamos a nossa atenção ser consumida em conteúdos digitais é o que deixámos de empreender a ler um livro, a divertir com um jogo, a passear, a arranjar em vez de comprar novo, a pensar, a escrever. Daí que a atenção dispersa tenha aumentado os níveis de ansiedade na sociedade e, consequentemente, gerado a necessidade do mindfulness ou atenção plena.
De acordo com a psicóloga Ellen Langer, a atenção plena é
«o processo de reparar activamente em coisas novas. Quando o fazemos situamo-nos no presente. Tornamo-nos mais sensíveis ao contexto e à verdadeira dimensão das coisas. É a essência do envolvimento. E é um processo que produz energia, em vez de a consumir.» (in “Inteligência emocional: atenção plena”, Harvard Business Review, Actual, 2019)
A tomada de decisões precipitadas quando colocamos ciência e a fé em antítese entre si, fecha-nos sobre a pseudo-omnipotência da nossa opinião. Por vezes, essa opinião baseia-se em coisas ultrapassadas, fora de contexto e acabamos com a energia disponível consumida com muito pouco. A informação neste caso é como grãos de um deserto que não saciam a sede a ninguém. É preciso despertar a consciência plena ou noofulness.
Se a atenção plena, ou mindfulness, nos leva a re-centrar o pensamento na novidade contida no momento presente, a consciência plena, ou noofulness, liga a maior sensibilidade ao contexto com a experiência concreta da vida.
Noofulness é o estado relacional da consciência no qual estamos activamente cientes do presente, questionando o que é novo e o modo como contextualizamos essa novidade na nossa vida.
Será o desenvolvimento de uma consciência plena que fará da informação dispersa, gotas de água que congregam e saciam a nossa sede de saber. Pois, leva-nos a questionar o que não faz sentido quando confrontado com a nossa experiência de vida no presente.
Desse modo, somos imersos numa dimensão da realidade humana onde ciência e fé se encontram para dar sentido e significado ao que vivemos, para além daquilo que sabemos ou pensamos saber. Daí que duas das atitudes mentais mais importantes para a noofulness sejam a curiosidade e a humildade. O curioso em nós pergunta. O humilde em nós reconhece o quanto há ainda para aprender e viver.